Como ser de Cristo sem ser do cristianismo?


Sempre foi para mim uma dificuldade em me associar ao cristianismo, em especial a vertente evangélica. Primeiro por causa da má fama que possuíam e não queria me associar com essa fama, como hipócritas, que só pensam em dinheiro, que são arrogantes por acharem que só eles são filhos de Deus e vão ser salvos, entre outras, e em segundo por causa das minhas características pessoais, minha liberdade, espontaneidade, que sempre foram um problema por onde andei. No entanto nunca tive vergonha do Evangelho ou do Cristo, porém levou um tempo até eu conseguir separar Cristo de cristianismo e assim me livrar desse problema.

Sim! Cristianismo e Evangelho não são necessariamente a mesma coisa e muito menos dependente. É possível se converter a um sem ser converter ao outro, aliás isso é muito comum.

O Cristianismo é uma religião como qualquer outra, e, do ponto de vista do resultado histórico e existencial, o Cristianismo é tudo, menos a melhor religião.

Inegavelmente está à frente de religiões antigas que apregoam práticas violentas. É uma religião mais sofisticada filosoficamente. Tem um apelo racional maior do que muitas, e um valor moral inegável. Porém é inferior a certas religiões orientais que são mais profundas do ponto de vista da compreensão do mundo e do ser, e a outras que são mais fraternas e menos judiciosas.

E me dirão?  - Mais o cristianismo é uma religião que prega o amor de Deus. E eu direi: - sem dúvida, porém o moralismo cristão na maioria das vezes sufoca esse amor, fazendo desaparecer na prática.

Em resumo, quando falamos de cristianismo estamos falando de um fenômeno social humano, como qualquer outra religião da face da terra. E o discurso que diz que o cristianismo não é uma religião, porque não se trata da busca do homem, mas da de Deus, é uma falácia.

O Evangelho ao contrário da religião não se fundamenta em moralismo ou doutrinas teológicas-filosóficas. Não se trata da produção humana seja ela moral, estética, ética, ou qualquer outra que sirva para barganhar com Deus.

O Evangelho é uma Verdade anunciada ao coração e testificada pelo Espírito que provoca fé, sem moral salvadora, sem estética que encante a Deus, sem ética que dê superioridade ao cultuador e sem formalidade que supostamente agrade a Deus.

O Evangelho não é religião. Mas o Cristianismo é religião. Nele temos todas as formalidades das religiões, temos uma teologia moral, temos um corpo de doutrinas de forte influência grega, e um sistema de governo inspirado pelos romanos, sem falar que a missa cristã é a repetição do sacrifício de Cristo, o qual é assim praticado para que a população pobre e simples fique sempre em permanente dependência do Cristianismo.

No Cristianismo Protestante e Evangélico, no início, se tentou resgatar a fé simples e original. No entanto, menos de 60 anos depois, tudo já era como dantes do Quartel de Abrantes. Assim, os ritos, as formas, as imagens de santos, as heresias gritantes, e a convergência do poder de Deus e da representação de Deus antes feita pelo Papa, foram substituídos por outras coisas. 

Na religião cristã Cristo é secundário, em algumas vertentes os líderes são mais importantes, em outras os ritos são mais e em outras a interpretação das escrituras são mais importantes. O Espírito é apenas um nome, não é ele que atua no coração das pessoas, exceto, por conveniência quando tais pessoas se submetem as doutrinas da religião.

Na religião cristã a salvação depende de sua relação com a instituição, no Evangelho depende da sua intima e intransferível relação com Deus. Na religião cristã a fé é um corpo de doutrinas, no Evangelho é uma potência que nos move. E a Graça na religião cristã é apenas uma doutrina a mais, no Evangelho é o fundamento de tudo.

Assim, é possível ser cristão sem ser de Cristo, como também é possível ser de Cristo sem ser do cristianismo.

Jesus não fundou o Cristianismo. Essa religião é um desdobramento histórico de interesses políticos de certos grupos em Roma. Tudo que se desenvolveu no interior dessa religião tem a ver com esses interesses do que com o Evangelho de Jesus.

Para os religiosos de seu tempo Jesus apenas disse que muitos publicanos, pecadores e meretrizes precederiam os mais rigorosos filhos da religião e garantiu que muitos haveriam de vir dos quatro quantos da terra a fim de assentarem-se com Abraão, Isaque e Jacó na mesa da Festa do Reino, enquanto muita gente da religião tida como oficial ficaria de fora.

Talvez alguns ainda insistam: mas como saberão sobre o Evangelho se não fosse-for o cristianismo? Ah! Mentes incrédulas, o nosso Deus é Senhor e ele fala a quem quiser de Si mesmo.

O cristianismo não é o porta-voz de Deus e nenhuma religião é, mesmo que Ele possa falar com qualquer por qualquer meio inclusive pela religião.

Eu sou um que historicamente estou ligado a religião cristã, mas que existencialmente e espiritualmente em nada dependo dela. Abracei o Evangelho e descansei na Graça e caminho por fé, irmanando-me com todos os homens, filhos do mesmo Deus.

Eu, prego o Evangelho e não o cristianismo. Anuncio a Boa Nova de uma existência reconciliada com Deus, sem medos ou pânicos, e sem a angustia diabólica do juízo.

Ser discípulo de Jesus é ser do Caminho, da Verdade e da Vida. Não é um caminho religioso; é apenas um caminho de reconciliado com Deus, conosco mesmos, com o próximo e com a criação!

Ivo Fernandes
29 de janeiro de 2017

(Os textos em itálico são de autoria de Caio Fábio)

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