A academia e o divã



Vivemos em um tempo onde não podemos pensar a saúde apenas por um olhar. Saúde é sempre saúde integral. Aliás, esse é o conceito da OMS, que define saúde como “um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não somente ausência de afecções e enfermidades”. Sendo assim, ninguém deveria procurar apenas a academia, ou apenas o divã, mas ambos.
E por quê? Porque precisamos analisar nossa relação com a imagem, pois o culto ao corpo perfeito é sintoma, e como todo sintoma esconde outros elementos. Perceba, qualquer um pode desejar e buscar modelar o corpo, mas quando esse desejo está associado a uma fragilidade emocional ou psíquica, o que vemos são indivíduos que fazem má utilização de suplementação alimentar, o uso de esteroides anabólicos sem necessidade indicada, e um excesso de exercícios físicos.

Esse tipo de transtorno tem nome e classificação, estamos falando da vigorexia, doença psicológica caracterizada por uma insatisfação constante com o corpo levando-os à prática exaustiva de exercícios físicos. Pode estar associada a uma distorção da autoimagem e a um transtorno psicológico similar à anorexia.
No manual da OMS a Dismorfofobia corporal está classificado como um tipo de transtorno hipocondríaco (CID-10 - F45.2) com a seguinte descrição:
A característica essencial deste transtorno é uma preocupação persistente com a presença eventual de um ou de vários transtornos somáticos graves e progressivos. Os pacientes manifestam queixas somáticas persistentes ou uma preocupação duradoura com a sua aparência física. Sensações e sinais físicos normais ou triviais são frequentemente interpretados pelo sujeito como anormais ou perturbadores. A atenção do sujeito se concentra em geral em um ou dois órgãos ou sistemas. Existem frequentemente depressão e ansiedade importantes, e que podem justificar um diagnóstico suplementar.

Percebemos que atualmente existe uma grande insatisfação com a imagem corporal, essa insatisfação pode ser um dos fatores que levam a tentativas de solução que são conduzidas de maneira exagerada. E aqui, entra o divã, na tentativa de ajudar as pessoas a entenderem sobretudo seu desejo e aprender a bem lidar com ele.

A vida é maior que o corpo, mas também é o corpo. O imperativo, portanto, não deve ser do corpo perfeito, mas da saúde integral. A psicanálise pode colocar suas ferramentas para trazer uma compreensão sobre o desejo de todo sujeito. Uma boa equipe de saúde, não deve dispensar o atendimento psicanalítico, que pode atuar desde o atendimento clínico individual, bem como levar os profissionais de educação física a compreenderem melhor seus clientes, e poderem conduzir melhor suas aulas e treinos.

O corpo deve revelar nossa identidade e não servir de esconderijo para uma alma fragilizada. Assim qualquer um que deseje realmente estar bem, não bastará se ver bem, e se sentir bem, é preciso de fato viver bem.
É preciso desenvolver conjuntamente músculos, autoconhecimento, autoestima e satisfação consigo mesmo. É preciso vencer o narcisismo patológico que implica na carência crônica de amor próprio e, não excesso, como geralmente se pensa, e para isso precisaremos identificar como se deu o percurso dos sujeitos na formação de suas subjetividades. É preciso uma escuta qualificada daquele que busca uma mudança no seu corpo. Faz-se necessário então, unir a academia e o divã, pois juntas podem contribuir para a saúde integral dos sujeitos.

Ivo Fernandes
25 de abril de 2020




Algumas fonte de pesquisa:
Freud, S. (2010). Introdução ao narcisismo. In S. Freud, Introdução ao narcisismo: ensaios de metapsicologia e outros textos (Paulo César, Trad.) (Vol. 12 pp.13-50). São Paulo: Companhia das Letras. (Obra originalmente publicada em 1914).

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