Praia do Futuro
Eu tinha 11 dias de vida quando
fui dedicado ao Mar e seus mistérios, suas lendas e seres. E aqui nessa praia
chamada de Futuro vivi todo meu passado. Cresci deixando meus rastros na areia
que logo eram apagados pelas ondas. Foi aqui que aprendi a orar, e nunca tive
outra Voz divina senão o som de muitas águas. Orações longas para as longas
caminhadas, ao alvorecer do dia, ou ao entardecer, no silêncio, na canção, mas
sempre aqui.
Trouxe a este mar, todos os meus
sonhos infantis, todos os meus amores adolescentes, todas as minhas dores
juvenis, todas as minhas paixões adultas, e toda a minha vida. Não há nada que
não tenha apresentado ao Mar. Minhas poesias são cheias deste lugar e minha
alma da maresia desta praia. Minhas melhores histórias de amor tiveram seus
nomes escritos nessas areias, e todas as minhas filhas tiveram seus nomes
revelados aqui.
Não sei as tramas do destino, mas
a única coisa do meu pai que ficou em mim, já que ele nunca teve um dia sequer
comigo por não ter me desejado, foi o fato dele ser um pescador. Ele me deu o
mar de Antônio. E o passado de minha mãe com este pescador foi marcado por um
porto.
A família que me criou tem uma
casa até hoje aqui, na minha infância não tinhas muros, o mar era meu quintal.
E quantas vezes as águas bateram na porta. Um dia em uma das minhas orações
chamei este lugar de praia inicial da minha vida, e que um dia ela seria a
praia final da minha existência.
Ah o mar! Eu não tenho outro
lugar sagrado. Não tenho outro som divino. Não tenho outro mistério. Tudo meu
está aqui, tudo que sou está aqui. Já disse, mar, metade da minha alma é feita
de maresia, e a outra que antes dizia que não sabia, carrega elementos do
profundo oceano.
Por força da vida adulta e de
tantos encontros da existência, fui levado para muitos lugares, e por muito
pouco o fim da minha vida não se deu entre muros, asfaltos e edifícios. Mas,
não seria justo. E sem eu perceber as teias do destino se construíam. Meus
castelos se desfizeram, minhas velhas bases foram desfeitas, e tudo que havia
construído longe daqui acabou. E quando percebi que não havia mais nada, o
destino me forçou a procurar um lugar para estar, confesso que minha mente
pensou em milhares de locais e os procurei, menos aqui. Nada encontrei, e aí
justamente em frente onde tudo começou estou agora.
Um quarto branco com janela de
frente para o mar e o vento tomando conta de todo ambiente, o som das águas
como música aos meus ouvidos. Ao acordar o sol me despertou, o mar me chamou e
lá estava eu, caminhando horas sem perceber o tempo. Minhas velhas e longas
orações. Pra onde irei depois daqui, talvez fique um pouco mais de tempo nesse
quarto ou vou para casa vizinha, ou ainda pra qualquer outro espaço em frente a
esse mar, mas sinto que não sairei mais daqui, pois voltei a praia inicial no
tempo final.
Espero concluir aqui minha meta
de me tornar quem sou, no único lugar da face da terra que me ajudou nisso!
A praia do meu passado, é minha
praia de agora e ela se chama praia do futuro!
Ivo Fernandes
13 de junho de 2014
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