A questão do sofrimento
Nenhum
desafio é maior a nossa maturidade do que revisitar o que não se pode mudar, e
ainda sim continuar a caminhada da vida. Um passado que não pode ser mudado, um
amor que não pode ser restaurado, uma doença incurável. Respirar bem fundo para
prosseguir. Retirar forças de onde não há, reter esperanças que já não mais
possui, tais coisas, de fato, realizadas são a prova da nossa força em meio a
fraqueza, do nosso espírito, da nossa fé.
É
difícil, mas me parece incontestável que é na dor que nos tornamos homens. A
alma é forjada no sofrimento, na angústia, na perda. Com isso não ignoro as
lições advinda da alegria, do gozo, do prazer, mas não conheço ninguém que
possa ser chamado de espírito evoluído que não tenha sido nos desertos que
tornara-se.
Talvez
nosso maior exemplo seja o do próprio Nazareno, também chamado o Sofredor. Nos
seus ensinos fica claro o valor do sofrimento no discipulado. No entanto, não
se trata de um desejo por sofrer como interpretaram alguns mártires do passado,
mas de uma lição de superação e crescimento. O sofrimento não passará enquanto
não for suportado. É na aceitação da cruz que a agonia do Getsêmani passa.
O
Deus de Jesus também é um Deus sofredor. O deus onipotente dos ‘gregos’ não responde
a questão do sofrimento. Esse deus perfeito,imutável, exaltado, indiferente e
fechado em si mesmo, em nada se parece com o Deus de Jesus que assume riscos
por amor.
A fé cristã revela um rosto diferente de Deus. Revela um Deus
crucificado. E crucificado pelo amor. O amor é sofredor e nossa esperança está
no amor que sofre e passa pela morte sem por ela ser destruído, abrindo o
futuro da esperança e da vida a todos os crucificados da história.
Na cruz de Jesus o mundo com toda sua dor foi assumido em Deus.
Logo o deus vingador e castigador, guerreiro, não é o mesmo Deus da cruz. O
crucificado desarmou Deus, jogou por terra todos os deuses poderosos instalados
em seus tronos. A projeção das frustrações humanas na onipotência divina é
desmascarada, revelando-se como aquilo que na verdade é: projeção da própria
vontade humana de poder.
Assim, este Deus que sofre ensina ao sofredor o caminho da vida,
o caminho da cruz que nos leva ao sepulcro vazio e a manhã de domingo.
Ivo Fernandes
24 de fevereiro de 2013
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