O poço



Assisti duas vezes ao filme – o poço - Um filme de Galder Gaztelu-Urrutia com Ivan Massagué, Zorion Eguileor, Antonia San Juan, Algis Arlauskas, exibido pela Netflix. Trata-se de um filme sobre nós, sobre nosso modelo de sociedade, e está cheio de símbolos para nos fazer repensar nossa atual forma de vida.

A gente vive um modelo e não se importa mais em questionar, ou procurar saber como chegamos nessa lógica. Por que nos dividimos em classes sociais? E por que nenhuma classe se importa com a outra? Nossa loucura é apenas em subir de classe, sem notarmos os milhares estão caindo rumo a morte.

Damos tanto valor a coisas supérfluas, compramos tudo que nos convenceram que era importante ter, mas que na verdade não serve para nada. Nos perdemos nos detalhes desse jogo, quando a única coisa que no fim importa é o que vamos comer. Isso é óbvio.

Criamos um sistema para sobrevivermos, mas agora vivemos para manter o sistema, sem notar que ele mais nos mata do que nos mantém. Os que tem sempre querem mais, aumentado a distância entre as classes e as pessoas. Eis a desgraça de nossa desigualdade social. Por que fazemos isso?

O sistema tornou-se nosso diabo, pois ele não permite que o destruamos. Quem não se adepta será taxado como louco e afastado do meio. Mas quem se adequar receberá seu certificado homologado. Para que raios serve um certificado homologado?

Estamos tão cegos que nem sabemos até o onde vai a desgraça de todo esse mal. Mas já sabemos que a violência já chegou as nossas portas. E de quem é a culpa? Será apenas de cada um, em sua individualidade? Será que o sistema não é perverso, nos impedindo o bom-senso?

Sei que muitos acreditam na meritocracia e que tudo depende apenas do querer, esses ignoram que a fome desata a loucura, e que com o tempo até as melhores amizades se desfazem nesse jogo perverso de interesses e sobrevivência. Não somos todos nós responsáveis por tudo que nos ocorre?

O fato é que a gente acaba se distraindo com nossos prazeres e esquecemos o resto, até que sejamos empurrados para outras realidades. Nessa hora caímos em si e entendemos que o sistema nos engana sempre. Aí, nessa hora temos algumas opções, torcer para ficarmos em níveis intermediários, garantindo a própria vida, ou procurar usar da nossa liberdade para promover a mudança, em vez de desesperar e por fim a si mesmo. A mudança não virá naturalmente, precisaremos fazê-la acontecer.

Eu sei que não é fácil! Nossa mente se enche de dúvida. E no meio da dúvida acabamos cedendo a projetos extremos que em nada substancialmente muda o cenário, mas apenas os grupos que estão em cima. Precisamos aprender alguma coisa com os sábios, é preciso ação e conhecimento, mas o mais importante não é um projeto econômico, mas um projeto existencial.

Precisamos deixar a mensagem se encarnar na gente, a ponto de viramos a própria mensagem. Precisamos acreditar no dom da vida e entender que ela é um direito de todos, e somente garantindo a vida do outro que a minha será garantida.

Se a mensagem se encarnar em nossos atos, ela será maior que nós, pois se morremos no caminho, outros encarnarão a mesma mensagem que viram e leram em nós, e a mensagem prosseguirá.

E um dia ela conseguirá ser a mensagem em todos. Nesse dia não haverá mais fome, portanto não haverá mais loucura e aprenderemos a gozar da vida!

Estou sendo ingênuo? Talvez seja minha síndrome de Dom Quixote, me fazendo buscar a justiça e a beleza, mas eu espero que eu não acabe como esse personagem, cedendo a dureza da realidade, mas que nela eu plante sempre a mensagem da superação da morte, assim como fez outro sonhador, Jesus Cristo, que me ensinou que a mensagem é dar a vida pelos outros. Mas, isso só servirá de fato, quando todos encarnarem a mensagem, pois nesse dia justamente porque todos são capazes de dar a vida pelo outro que ninguém precisará morrer.
Isso não é comunismo, isso é comunhão que vence qualquer sistema econômico e social e estabelece a paz.
Ivo Fernandes
26 de março de 2020
(11° de confinamento)

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