A mensagem política de Jesus?!
Mateus 20.1-28
Sabemos que
a figura de Jesus é usada para todos os gostos, mas temos tentando resgatar por
meio de análises sérias qual teria sido a mensagem de Jesus de Nazaré. Assim
muitas questões surgem para saber se ele abordou diversos temas. Num período
como o nosso onde os políticos se aproveitam da religiosidade das pessoas para
angariar votos faz-se importante saber qual era a mensagem política de Jesus.
Havia uma?!
Quando vamos
analisar como Jesus se comportou na sociedade de seu tempo, vemos que nem todas
as coisas são claras. E mais a gente aborda a questão da atitude política de
Jesus interrogando os Evangelhos a partir de nossas preocupações, o que em si
não é um problema desde que possamos deixar também que o Evangelho nos
interrogue e nos interpele.
Para
pensarmos a mensagem política de Jesus temos que tentar enxerga-lo em seu
próprio tempo. É preciso levar em conta o mundo dele; o contexto
sócio-político, as estruturas vividas por ele.
A
sociedade em que Jesus viveu era uma sociedade pré-capitalista, transacional,
substancialmente agrícola. Não era urna sociedade industrial como a nossa. Lá
predominava a agricultura. E como eram as relações na agricultura? A
propriedade da terra na palestina, Judéia, Samaria, Galiléia, estava
concentrada nas mãos de pouca gente. Aliás, dá para perceber que no fundo de
muitas parábolas, temos a situação do latifúndio, da concentração da
propriedade da terra. E inegavelmente nestas parábolas
encontramos uma atitude crítica sobre a riqueza. Em várias passagens
Jesus antagonizou Deus e as riquezas (Mt 6.24; 19.22-24; Mc 4.19; Lc
6.25;12.15,21). Para ele o caminho da vida passa pela partilha, sem essa
consciência era impossível seguir Jesus. Portanto como economia e política
andam juntas, já podemos desvelar uma postura de Jesus frente a esse assunto.
No
tempo de Jesus, o Estado é o que chamamos hoje de teocrático. Ou seja, um
Estado religioso. O sumo sacerdote é o dirigente político da nação. Existe
ainda o Sinédrio, que é uma espécie de tribunal, de conselho, formado por 80
homens que dirigem a nação, tendo à frente o sumo sacerdote.
Qualquer comportamento religioso, nesta situação, é um comportamento político. Não
havia divisão, política de um lado, religião de outro. Logo quando Cristo, por
exemplo, cura em dia de sábado e não observa as tradições, ele está tendo um
comportamento subversivo, antipolítico. Com posturas semelhantes a essa ele
dessacraliza o poder político, não pensa em poder religioso, teocrático.
Cristo
tem uma atitude critica frente aos poderosos. O conflito
entre Jesus e os dirigentes do povo atravessa os Evangelhos de ponta a ponta.
No Evangelho de São Marcos, o mais antigo dos Evangelhos (embora apareça em
segunda posição no livro do Novo Testamento), a gente percebe um progresso na
oposição entre Cristo e os dirigentes. No capítulo 2, quando cura um
paralítico, os Fariseus cochicham entre si e dizem. “Esse homem blasfema,
porque ele perdoa pecados”. No capítulo 2, Jesus esta jantando com os
publicanos. Os Fariseus conversam com os discípulos e dizem:” Como é que o
mestre de vocês almoça com os publicanos”. Logo em seguida, quando os
discípulos infringem o sábado, esmagando, descascando as espigas de trigo e
comendo, então ai aparece o ataque direto a Cristo: “Como é que seus discípulos
infringem o dia de sábado?” Mais adiante, atacam-no porque ele não lava as mãos
antes de comer, desrespeitando a tradição.
Em
Jerusalém, o conflito é aberto. Jesus ataca diretamente os Escribas, Fariseus,
os Sumo Sacerdotes e os Saduceus, Expulsa os vendilhões do Templo, e declara
que o Templo vai acabar. O Templo significa o sistema da época. Amaldiçoa
também a figueira, símbolo do sistema Judaico. A maldição da figueira significa
maldição daquela sociedade. Foi logo entendido esse gesto profético de Jesus. É
claro, uma semana após ela é levado ao tribunal, e condenado a morte na cruz.
Penso que
com tudo isso Jesus não foi um político de oposição, mas um profeta. Não havia
programa político na mensagem de Jesus. Ao contrário falou do fim da mesma,
quando fala do fim dos poderes. Mesmo que algumas posturas pudessem fazer dele
um tipo de Zelote, na totalidade da mensagem vemos que inclusive esse grupo é
alvo das críticas de Jesus. Jesus não tinha partidos. Jesus anda em companhia
dos fiscais, se relaciona com os romanos e resiste à tentação do poder.
E essa
resistência é fundamental para entendermos a mensagem. Jesus considera que os
sistemas de poder dividem os homens. Não podemos afirmar que Jesus estimulou
revoltas, mas também não podemos dizer que afirmou o sistema. Por exemplo, no
caso da moeda com a figura de César, ele claramente afirma para se dar a César
o que lhe é próprio, mas com isso ele apenas afirma o limite do poder do
sistema, afinal onde não houver a marca de César, há liberdade e ali há o Reino
de Deus. Jesus está dizendo que o sistema não tem direito algum sobre a vida e
a consciência dos homens.
Entre os
discípulos de Jesus não há governo! Onde há governos não há o Reino de Deus,
mas o caminho não é a revolta contra os governos para se instaurar novos
sistemas que na prática viram outros governos, mas a criação de uma comunidade
subversiva, o fermento em meio a massa. Sejam uma sociedade sem poder, sem
autoridade, sem hierarquia. “Não seja assim entre vocês” ele disse. Não adianta
tentar modificar a sociedade de poder, é preciso criar outra sobre novos
fundamentos. E isso não se trata de uma dessocialização, como entenderam as
comunidades do deserto.
Ora o
próprio Deus de Jesus não nos é apresentado como um Poder. Entre o Pai e o
Filho não há hierarquia. Eis o mistério da fé, Deus conhecido como Todo
Poderoso abriu mão de seu poder e tornou-se servo de todos! E o que nos leva a
afirmar a divindade de Jesus não é seu suposto poder, mas seu amor para com
todos os homens.
A mensagem
de Jesus não é convite político mas profético – abandonar o poder. (Mt 5). Ouse
viver sem senhores! Um cristão não é de direita ou de esquerda e nem de centro,
ele não é desse mundo – ou seja desse sistema de poder.
Ivo
Fernandes
24
de setembro de 14
(As
passagens em itálico são de Clodovis Boff)
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